quarta-feira, 22 de julho de 2009

A criminalidade no Brasil.


A criminalidade no Brasil ocorre devido a carência de recursos econômicos e técnicos, aliada à falta de apoio político-institucional, no governo federal e principalmente nos governos estaduais, no Legislativo e no Judiciário.
Causas:

Segundo o III Relatório Nacional sobre Direitos Humanos no Brasil, a ineficácia do Estado perante o aumento da violência gera ainda mais violações de direitos humanos e impunidade, além de aumentar o sentimento de insegurança e revolta da população.

Dados:

De acordo com o estudo, 48.374 pessoas morreram vítimas de agressão em 2004, uma média de 27 por grupo de 100 mil habitantes.

Na faixa etária de 15 a 24 anos, foram 18.599 mortes, média de 51,6 por 100 mil. Entre 2002 e 2005, 3.970 pessoas foram mortas por policiais no Rio de Janeiro e, em de São Paulo, 3.009. O estudo apontou também um aumento dos conflitos rurais que passaram de 925 em 2002 para 1.881 em 2005. O número de mortes nessas disputas quase duplicou no período, subindo para 102 vítimas.

A conclusão é de que houve retrocesso nessa área de 2002 a 2005.

Trabalho infantil como forma de violência:

A exploração do trabalho infantil cresceu nomeadamente no Nordeste e Sudeste do Brasil, apresentando decréscimos nas outras regiões. O estudo mostra igualmente que 151.227 novos casos de trabalho infantil foram detectados de 2004 para 2005, subindo de 1.713.595 para 1.864.822 registos.

Outra conclusão do relatório é a de que persiste o trabalho escravo em todas as regiões do Brasil, à excepção do Sul.

Em 2004, os pesquisadores da USP registaram 8.806 casos de trabalho análogo ao escravo no país.

Punições:

O relatório enfatiza que a maioria dos homicídios é precariamente investigada e que uma «ínfima parte dos responsáveis é denunciada e condenada».

A conclusão é de que houve retrocesso nessa área de 2002 a 2005.

O estudo aponta também falhas nos sistemas policial e penitenciário e denuncia a participação de autoridades em violações aos direitos humanos.

A Criminalidade no Brasil bate recorde, apavora a sociedade e os governantes não conseguem vencer os bandidos.

Alexandre Secco VEJA - 7/6/00

Há uma sensação generalizada na sociedade de que o Brasil pode estar perdendo a chance de vencer a guerra contra o crime. Observem-se os seguintes números. São de assustar. .50% dos moradores das capitais evitam sair à noite com medo dos assaltantes, 38% já não circulam por algumas ruas que consideram perigosas e 24% mudaram o trajeto até a escola ou até o trabalho para se esquivar do contato com ladrões. Por medo de se meter em confusão, uma multidão de brasileiros, estimada em 15% da população, evita conversar com estranhos e até mesmo com vizinhos. Os dados fazem parte de uma pesquisa encomendada pelo Ministério da Justiça com 1.600 pessoas em dez capitais cujo objetivo foi avaliar o impacto da criminalidade na população. .Outra pesquisa, realizada pelo instituto Vox Populi em cinqüenta cidades brasileiras, mostra que a criminalidade é citada em quarenta municípios como um dos três problemas que mais preocupam a população. Em vinte cidades, o crime já é o problema número 1.

A frota de blindados no Brasil dobrou. Já dá para blindar um carro em mensalidades de 1 000 reais. O mercado local só perde para o do México e o da Colômbia, países que enfrentam a guerrilha .O Brasil tornou-se o terceiro maior mercado de carros blindados do mundo. Perde apenas para a Colômbia e o México. Em 1997, havia dez empresas explorando esse mercado, e a frota de blindados era de um veículo para cada 20.000 carros em circulação no país. Atualmente, passados apenas tr ês anos, há um número cinco vezes maior de firmas especializadas em blindagem no Brasil. E a frota de veículos com essa proteção dobrou. O novo filão são os consórcios para atender a classe média alta. É possível blindar o carro a partir de 1.000 reais por mês. .Para se proteger dos bandidos, indústrias, lojas e condomínios mantêm um exército de 1,3 milhão de pessoas trabalhando como seguranças em todo o país. É um contingente de guardas cujo tamanho equivale ao dobro do efetivo de toda a força policial d os 27 Estados brasileiros. O mercado de segurança vem crescendo a uma taxa de 30% ao ano. Uma em cada catorze residências brasileiras possui algum equipamento para prevenção de assalto, além das grades – o dobro do que havia cinco anos atrás. .Um em cada cinco jovens brasileiros que vivem nas maiores capitais já viu o corpo de alguém que morreu assassinado. A pesquisa foi conduzida pela socióloga Nancy Cardia, da Universidade de São Paulo, especialista em estudos de violência. Quem sai de casa numa metróp ole brasileira convive com a possibilidade concreta de ser alvo de um ataque físico. Assaltos no semáforo e seqüestros relâmpagos tornaram-se ocorrências comuns. Entre os habitantes das grandes cidades, todos sem exceção têm algum parente ou amigo ou colega de trabalho que já esteve sob a ameaça de um revólver na cabeça. Pela repetição, os casos de assalto a mão armada só chamam a atenção da opinião pública quando o assaltante mata a vítima. Os estudiosos dizem que, num cenário agudo de banditismo como o que se vive no Brasil, as pessoas desenvolvem um sistema de proteção, uma carapaça que as faz parecer menos sensíveis. Quando se dá um assassinato numa cidade do interior, o acontecimento traumatiza a sociedade local. Em São Paulo, no Rio de Janeiro, em Vitória ou no Recife, o crime de morte tornou-se ocorrência banal porque acontece às dúzias – a cada semana.

O Brasil está ultrapassando todos os limites do tolerável nessa área. De acordo com os últimos dados confiáveis, referentes a 1997, ocorrem 40.000 assassinatos por ano no país. O número frio adquire um significado sinistro quando se descobre que, nesse terreno, o Brasil supera sozinho a soma dos assassinatos ocorridos anualmente nos Estados Unidos, Canadá, Itália, Japão, Austrália, Portugal, Inglaterra, Áustria e Alemanha. Repita-se: há mais homicídios no Brasil que em todos esses paí ses somados. Assim, o Primeiro Mundo só alcança a estatística brasileira de homicídios quando reúne uma população por volta de 700 milhões de habitantes. Troquem-se as nações ricas pelos países da América Latina, onde a realidade social é semelhante à brasileira, e a comparação continua escandalosa. Nesse cenário, com 24 assassinados por 100.000 habitantes, a taxa nacional de homicídios equivale ao quádruplo do índice da Costa Rica e é nove vezes superior à da Argentina. O Brasil só perde no ranking dos h omicídios para a imbatível Colômbia (78 mortos por 100.000 habitantes), Honduras (64 por 100.000) e Jamaica (29). Durante uma entrevista na semana passada, o presidente do Senado, Antonio Carlos Magalhães, sugeriu uma solução radical para reverter as estatísticas. Ele defendeu o emprego das Forças Armadas no policiamento de rua. No México, onde essa prática foi tentada, os militares se envolveram com corrupção, e os confrontos com bandidos ficaram mais sangrentos. Em resposta à sugestão de ACM, o presiden te Fernando Henrique Cardoso, que estava em viagem à Alemanha, afirmou: "A segurança é uma matéria séria. Não se pode resolver a questão com atos isolados, nem espetaculares. É um processo contínuo". Não importa o crime escolhido, o Brasil está sempre numa posição crítica. Na indústria mundial do seqüestro, o Brasil é o quarto país onde esse crime ocorre com maior freqüência. Perde para a Colômbia do narcotráfico, da guerrilha de esquerda e dos grupos paramilitares de direita. Fica atrás também do México e da Rússia. Em se tratando desses países, a posição brasileira está longe de ser confortável. A taxa de homicídios do Rio, 69 mortos por 100.000 habitantes, é quatro vezes maior que a de Moscou, nove vezes superior à de Nova York e 23 vezes maior que a de Paris. O Rio perde para Cali, cidade colombiana mergulhada na nuvem de crimes que cerca as quadrilhas da cocaína, e também para capitais de países africanos que estão em guerra. Quando se deixam fora da comparação exceções como essas, o Rio e meia dúzia de outras metrópoles brasileiras são imbatíveis.

Dobro de chacinas – Pobres ou ricas, todas as nações convivem com níveis altos de criminalidade em algum momento de sua história. As cidades americanas de Nova York, San Diego e Boston festejam um momento glorioso no combate ao crime, enquanto no mesmo país Washington e Detroit mantêm padrões brasileiros de violência. O que torna o Brasil especial é que o crime se transformou por aqui em epidemia que se alastra de maneira aparentemente descontrolada. Em 1980, ocorria um ass assinato a cada 53 minutos. Há dez anos, o índice subiu para uma morte a cada 21 minutos. Atualmente, dá-se um assassinato a cada treze minutos. Até os anos 90, apenas a periferia das duas maiores cidades do país, São Paulo e Rio, apresentavam taxas de homicídio de padrão colombiano. Na última década, outras três periferias entraram para o clube da alta mortalidade: as de Brasília, Vitória e Recife.

Coletes à prova de bala, antes restritos, agora estão nas lojas. O número de residências com equipamentos de segurança dobrou nos últimos cinco anos. Nas grandes cidades podem-se comprar alarmes e monitores de vídeo em supermercados Tão preocupante quanto o aumento do número de assaltos, seqüestros, roubo a bancos, latrocínio, estupros e outros crimes listados no Código Penal é que a ação do Estado vai surtindo efeito cada vez menor nas estatísticas. Entre 1995 e 1999, o i nvestimento público em segurança no Brasil subiu 30% e atingiu nível recorde. As exigências para a contratação de policiais aumentaram. Os novos soldados precisam ter o 2º grau. Antes, só se exigia o 1º. O salário aumentou em média 10% e os policiais militares ganharam um seguro de vida. Só no Estado de São Paulo foram gastos no ano passado 11 bilhões de reais em segurança – algo como a metade do orçamento empregado para manter em prontidão os 350.000 homens das Forças Armadas. O governo paulista comprou três helicópteros, 4 500 viaturas novas e 10.000 coletes à prova de bala. A polícia trabalhou mais do que nunca – e matou mais do que nunca também. Efetuou a cifra impressionante de 120.000 prisões em 1999, 50% mais que no ano anterior. Nada, absolutamente nada disso conteve a criminalidade. No mesmo período em que o governo paulista fez esse enorme esforço, o número de homicídios cresceu 30% no Estado. A quantidade de furtos e roubos de veículos dobrou. As chacinas dobraram em 1999 em relação a 1998. "Qu em se dedica a entender o que aconteceu desanima", diz o professor da Universidade Federal de Minas Gerais Claudio Beato, especialista em criminalidade.

A advogada Olívia Libório, de Salvador: 15% do salário vai para um segurança. Nesse ambiente de alto risco, os brasileiros fazem o que podem para se proteger. Apavorada com a possibilidade de ser assaltada pela quinta vez em poucos meses, a advogada baiana Olívia Libório decidiu entregar 15% de seu salário a um segurança particular que a acompanha pelas ruas de Salvador. "Tenho pânico de sair na rua", diz. "Para enfrentar os ladrões, só com segurança máxima", afirma Gladyst on Brandão, síndico de um prédio em Belo Horizonte equipado com circuito de interfones e sistema interno de câmaras de vídeo. Depois que os bandidos furaram o esquema de segurança e assaltaram o prédio, os moradores resolveram instalar cercas elétricas, mais dois porteiros foram contratados e o número de câmaras triplicou.

Gladyston Brandão, síndico em Belo Horizonte, triplicou o número de câmaras, instalou uma cerca elétrica e contratou mais dois porteiros para se proteger Há diversas teorias sobre as origens da criminalidade e as formas de combatê-la, mas são duas as correntes principais que surgem nos debates. Há um segmento de durões, representado, entre outros, pelo ex-governador paulista Paulo Maluf. Ele defende que o banditismo se combate com polícia na rua e repressão pesada. Outro se gmento, integrado por analistas com maior sensibilidade social, acredita que o crime é conseqüência direta e exclusiva da disparidade de renda entre a camada rica e a pobre da população, entrando aí não apenas o diferencial monetário, mas também as carências educacionais e sanitárias da parte mais numerosa dos brasileiros. São duas explicações que normalmente se repelem devido aos interesses políticos e ideológicos dos que as defendem, mas até o senso comum indica que elas se complementam, não se excluem. Não só isso. As razões da criminalidade e as ferramentas para combatê-la não se resumem a uma encruzilhada simplista com uma de duas opções obrigatórias. "Tentar simplificar essa discussão seria mais ou menos como buscar uma resposta única à pergunta: 'O que é preciso fazer para criar um filho?'", compara o advogado Márcio Thomaz Bastos, um dos criminalistas mais respeitados do país. Em torno da criminalidade há diversas verdades e muitos mitos. Algumas das verdades:

. Quanto mais cresce um país, menores são as taxas de criminalidade. Nos Estados Unidos, a taxa de crimes caiu pela oitava vez consecutiva no ano passado. O bom momento coincide com a fase positiva experimentada pela economia americana. O produto interno bruto cresceu mais de 7% ao ano nos EUA nos últimos dez anos e o desemprego é inferior a 4%, equivalente à situação de pleno emprego. No Brasil, a taxa de crimes violentos não pára de aumentar desde 1990. Nesse período, a ec onomia cresceu a uma taxa de 0,5% a 1% ao ano, em média. O desemprego brasileiro situa-se na casa dos 8%, taxa muito superior à média de 5% verificada no início da década de 80 ou aos 4% do início da década seguinte, de acordo com os cálculos do IBGE. .

Na maior parte dos homicídios, a vítima conhecia seu algoz. Em alguns casos, o assassinato é o desfecho de uma desavença entre vizinhos ou o saldo de uma briga entre marido e mulher. Em outros casos, a vítima devia dinheiro ao assassino ou a alguém para quem ele trabalha. No terreno da droga, é muito comum a cobrança de dívidas com balas na testa do inadimplente.

. A droga é a grande vilã. Calcula-se que a cocaína ou o crack estejam por trás de 60% dos assassinatos. Traduzindo: as taxas referentes a latrocínio, quando se mata para roubar, formam um pequeno universo de 5% a 6% dos casos de assassinato.

. O planejamento centralizado não costuma apresentar bons resultados. O governo Fernando Henrique Cardoso promete anunciar no próximo mês um programa nacional antiviolência. São trinta medidas para atacar a criminalidade. A proposta mais destacada prevê a criação de um fundo de 100 milhões de reais que o governo poderá usar para estimular políticas regionais de combate ao crime. A maior lição que os Estados americanos estão aprendendo é que cada região ou cidade tem uma pecu liaridade. A polícia também é diferente de um lugar para outro. Em alguns centros, o principal motor do crime é o crack, como em São Paulo. Em outros, como o Rio, o motivo de maior peso é a cocaína. Os programas de combate à criminalidade mais bem-sucedidos levam em conta diferenças como essas. O controle deve ser feito no distrito policial, com apoio financeiro e estratégico do governo federal, que pode fornecer estatísticas e patrocinar estudos.

. A criminalidade eterniza a pobreza e sua erradicação conduz à riqueza. Segundo o jornal americano The New York Times , na periferia de Chicago, onde a criminalidade sofreu uma redução de 36% entre 1992 e 1998, casas que dez anos atrás estavam avaliadas em 15 000 dólares estão valendo hoje dez vezes mais. . O combate ao crime começa na própria polícia. Em Washington, uma das cidades mais violentas dos Estados Unidos, que ostenta índices de criminalidade equivalentes aos do Terceiro Mundo, um terço da polícia está envolvido em casos de corrupção. A diferença é que essa turma está sendo colocada no olho da rua. No Brasil, as provas exigidas para demitir um policial corrupto só podem ser obtidas por outro policial. O resultado é patético. É comum encontrar na chefia de um setor delegados que respondem a processos criminais. Trabalham às vezes ao lado do colega que o investiga. Há 300 000 policiais atuando em nove dos maiores Estados brasileiros. Destes, 30 000 são acusados de algum crime – 50% deles apontados como autores de delitos pesados, como roubo a banco e a cargas, extorsão, seqüestro, homicídio e tráfico de drogas.

. O crescimento desordenado contribui para o aumento da criminalidade. Um caso clássico é uma região que forma um cinturão de pobreza em torno de Brasília. A população dessa região passou de 60 000 para 80 000 habitantes em cinco anos. Completamente abandonada pelo governo de Goiás, onde está localizada, sofre com as maiores taxas de criminalidade do Brasil. Nessa área, formam-se grandes aglomerações sem escolas, sem água, sem luz e sem a rede de proteção social organizada p or associações de moradores, igrejas e clubes. Os estudiosos acreditam que num ambiente tão rarefeito os jovens que têm alguma predisposição para transgredir a lei acabam recebendo o estímulo máximo de que necessitam. Acima estão algumas verdades sobre a criminalidade. Agora, vamos a alguns mitos que a cercam:

O que falta no Brasil é uma legislação mais dura contra os criminosos. Os perfis psicológicos traçados sobre os criminosos em todo o mundo mostram que eles calculam os custos e os benefícios de sua ação, como qualquer pessoa. Mas o bandido é sensato o suficiente para avaliar o risco prático de ser apanhado pela polícia, e não o risco teórico representado por uma legislação dura que dificilmente será aplicada. Há trabalhos internacionais que indicam que a prisão de um crimin oso desencoraja a ocorrência de quinze outros crimes violentos por ano. No Brasil, onde apenas 2,5% deles são desvendados, o aumento isolado da punição no Código Penal parece não assustar os bandidos. Desde 1988, vários crimes foram classificados como hediondos, o que torna as penas mais pesadas. Mas isso não baixou a criminalidade.

É difícil combater o crime porque ele é praticado de forma pulverizada. Ocorre exatamente o oposto. Como o crime acontece com mais intensidade em determinadas áreas, isso facilita o combate da polícia. A verdade é que mais de 40% de todos os crimes praticados no Brasil se concentram em regiões onde vivem 17% da população, basicamente na periferia do Rio de Janeiro e de São Paulo. Outra pesquisa conduzida nos Estados Unidos revela que 90% dos crimes se dão em 5% das ruas de uma cidade. Simulações realizadas em São Paulo pelo Instituto Fernand Braudel e em Belo Horizonte pela Universidade Federal de Minas Gerais chegaram às mesmas conclusões: a polícia tem meios de saber onde ocorrem os crimes para agir nesses lugares.

O Brasil não consegue baixar a criminalidade porque não copia modelos de sucesso. Não é necessário buscar a fórmula única. Há várias soluções eficientes. Nos Estados Unidos, a cidade de San Diego, na Califórnia, é a recordista na diminuição da criminalidade. Lá, os assassinatos caíram 76,4% nos últimos cinco anos. Qual é o segredo de San Diego? A cidade optou pelo policiamento comunitário. Em vez de contratar novos policiais, a prefeitura começou a treinar os moradores para que eles colaborem de forma mais eficaz com a polícia, vigiando as ruas de seus bairros e prestando informações sobre a circulação de suspeitos. Além disso, foram contratados aposentados para fazer rondas pela cidade. Nova York, que teve uma redução de 70,6% nos assassinatos de 1994 a 1999, adotou programas agressivos de repressão e intolerância total diante de pequenos delitos, o chamado Tolerância Zero. Para atacar a criminalidade, as autoridades dividiram a cidade em setores e nomearam um responsável para cada um deles. Sua missão era identificar as quadrilhas que atuavam em sua área e desbaratá-las. Além desse trabalho, projetos de assistência social foram financiados com dinheiro público e com a ajuda de organizações não governamentais. Gastaram-se bilhões de dólares para combater a pobreza e o desemprego. Programas de reciclagem e capacitação profissional foram aplicados aos condenados, para que pudessem arranjar emprego depois de cumprir pena. Boston, que registrou queda de 69,3% nas mortes violen tas, a terceira do ranking, aplicou um programa diferente. A prefeitura encomendou uma pesquisa à Universidade Harvard a fim de descobrir quais eram as principais fontes da criminalidade violenta na cidade. Em seguida, a polícia começou uma ação seletiva de combate aos crimes mais graves. O esforço policial foi concentrado na violência causada por armas de fogo. O problema das gangues de jovens e do tráfico de drogas foi abordado de uma forma não policial. As igrejas locais foram chamadas a colaborar com a polícia no terreno da orientação à juventude. A estratégia funcionou. Há algumas coisas básicas que se podem fazer para atacar a criminalidade – nenhuma delas fácil. É preciso começar pela limpeza da polícia. De nada adianta ter policial na rua se ele vai extorquir o traficante em vez de prendê-lo. É muito difícil operar essa transformação, já que o policial é um funcionário público estável que só pode ser demitido por justa causa. Além disso, a parte honesta da polícia necessita de tratamento mais dece nte. Deve ter melhor treinamento e salários mais altos. Um patrulheiro de rua dos Estados Unidos chega a ganhar até seis vezes mais que um policial brasileiro. Salários ruins espantam os candidatos mais qualificados e produzem uma força desmotivada. Vale a pena tentar a reforma. Um estudo feito nos EUA mostra que cada policial que vai para as ruas evita de vinte a trinta crimes graves.

O PM brasileiro tem carro, mas...... não tem rádio A polícia brasileira gasta em armas, coletes, carros caros e helicópteros, compras indispensáveis ao desempenho de seu trabalho. No ano passado, a PM paulista adquiriu quarenta jipes de 50 000 reais cada um (no alto). Segundo os especialistas, as autoridades são mais atentas às grandes compras que às pequenas. Exemplo: o PM brasileiro não possui um rádio de comunicação individual. Na foto, um grupo de policiais a mericanos, todos com rádio portátil. Fotos: Ricardo Benichio (no alto) e P. Landmann/Sygma Polícia melhor não basta. Na periferia das grandes cidades brasileiras, o Estado não aparece. Escolas, organizações esportivas, centros comunitários que ofereçam apoio às famílias são fundamentais como barreiras à expansão do crime. Creches para ajudar as mães e centros de treinamento de mão-de-obra ou mesmo cursos de arte ou algum tipo de diversão para as crianças e jovens também têm papel decisivo. Em lugares miseráveis, os jovens não vêem esperança alguma no horizonte. Se nada parece confiável, se nenhuma alternativa se apresenta, então por que não pegar uma arma e fazer um assalto? O cenário social desolador forja criminosos também. Políticas que aumentem o emprego e reduzam as diferenças de renda responsáveis pela criação de uma gigantesca casta de excluídos obviamente teriam um impacto imediato na redução dos índices de criminalidade brasileiros. Nenhuma dessas providências funciona a contento de f orma isolada. Nenhuma delas pode ser alcançada imediatamente e sem uma determinação muito grande. Mas o quadro da violência deteriorou-se de maneira assustadora. É preciso tentar alguma solução. Já. Indaiatuba, no interior de São Paulo, é conhecida como a cidade de veraneio dos milionários paulistas. Um de seus bairros, o Helvetia, concentra uma centena de mansões e 22 campos de pólo. De janeiro para cá, o pânico se alastrou na região. Em cinco meses, treze pessoas foram seqüestradas. Alguns freqüentadore s estão trocando as mansões por casas dentro de condomínios fechados. Em dois meses, um sistema de câmaras vai fiscalizar as vias de acesso da cidade. Cristine Prestes

Com reportagem de Cristine Prestes e Rodrigo Vergara, de São Paulo, José Edward, de Belo Horizonte, e Daniella Camargos, de Salvador

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